terça-feira, 30 de outubro de 2012

A Ideia, O Taxista e O Meu Rio.


 
Por Breno Góes, baseado em fatos reais


Como as pessoas procuram taxis, as ideias procuram pessoas de quem possam ser passageiras. Calma, eu me explico. É que, recentemente, assisti ao filme documentário The Mindscape of Alan Moore, uma entrevista com o grande quadrinista e mago inglês, e em dado momento ele comentou sobre como a ideia da máquina a vapor, jamais concebida por ninguém, de repente pipocou quase ao mesmo tempo nas cabeças de quatro pessoas em pontos diferentes do mundo, em pleno século XVIII. Outro inglês de quem eu sou fã, o romancista Terry Pratchett, elaborou em um de seus livros, já não lembro qual, um modelo segundo o qual as ideias seriam pequenas partículas que vagariam pelo espaço a procura de cabeças em que elas pudessem entrar e se fazer reais. O que esses dois ingleses dizem, sobre ideias como entidades com vida própria, Ideias com I maiúsculo, de repente fez todo o sentido pra mim, numa noite primaveril, quando eu pensava em Freixo, Paes e na cidade do Rio de Janeiro. Calma, eu me explico.

Fazia vinte dias  que acabara a campanha eleitoral na cidade do Rio, e eu me perguntava por que diabos Eduardo Paes conseguia ser tão popular entre nós cariocas, mesmo com sua flagrante simpatia pelo autoritarismo, até que precisei tomar um taxi. Precisei tomar um taxi, diga-se, para chegar na casa do meu amigo Arthur Aguillar, que é membro ativo do Meu Rio. Meu Rio, aliás, é um negócio que, se você não conhece, precisa urgentemente googlear. Quando entrei no taxi, assim que mencionei o endereço pra onde eu queria ir, o motorista me disse, sem qualquer motivo aparente, justamente como se uma Ideia tivesse acabado de entrar pela sua orelha:

-Ainda bem que o prefeito se reelegeu. Ele é muito bom.

Ora, não bastasse a minha militância ferrenha por Freixo, eu tenho por hábito encorajar taxistas a falarem mais, já que quase sempre algo se aproveita de uma conversa com esses profissionais, e nesse dia não foi diferente. Já influenciado por Moore e Pratchett, eu queria entender melhor aquela Ideia que, depois de vagar vinda de não sei onde, entrara na cabeça do homem no mesmo momento em que eu ia entrando no seu taxi. Imediatamente contrapus a afirmativa dele brandindo algum dos inúmeros problemas da gestão Paes. Não lembro se eu falei das remoções, da especulação imobiliária, das licitações dos ônibus e vans ou das associações flagrantes de Paes com milicianos. Pode ter sido qualquer uma dessas coisas. O que eu me lembro é que ele me respondeu com um outro (suposto) ponto positivo da gestão do prefeito, que eu contrapus com mais um negativo, e assim por diante. Até que em dado momento, quando era a minha vez de falar, lembrei a ele do problema com os usuários de crack. E aí a Ideia que se entrincheirara dentro do motorista de taxi finalmente disse a que veio:

-Ah, os cracudos! Eu também acho que ele está fazendo errado com os cracudos! Eu tenho uma Ideia sobre o que fazer com esses cracudos. Não tem que matar não. Sabe o que que tem que fazer?

-O que?

-Você já viajou de carro pelo estado do Rio,  ou por qualquer estrada do Brasil?

-Já.

-Então! Já viu quanto espaço livre que tem? Esse país tem espaço livre de sobra! Olha só, tem que pegar um descampado desses, e construir um negócio que seja impossível da pessoa lá dentro fugir. Im-po-ssi-vel. Daí bota esses cracudos pra trabalhar aquela terra lá. Trabalhar, entende? Que nem eu e você. Mas tem que trabalhar direito, senão leva ferro.

Nada se compara ao prazer de ver uma Ideia nua, arreganhada mesmo, em toda sua beleza e feiura. Respondi:

-Ah, mas já tentaram isso antes, na Europa.

-Ah é, onde?

-Na Alemanha.

-E lá deu certo?

Não sei se a Ideia dentro da cabeça do taxista estava só se fazendo de cínica. Decidi responder com sinceridade. Pensei em Bush, na Candelária, no Carandiru, em Khadaffi, Pe. Lauro Palú, Cabral, Paes e pensei também, por outro lado, no Meu Rio, do meu amigo arthur Aguillar, aquele negócio que você já devia ter procurado no google lá no início do texto. “Deu certo?”, a pergunta ecoava.

-Depende. De certa forma.




LINKS:

MEU RIO: http://meurio.org.br/


THE MINDSCAPE OF ALAN MOORE: http://www.youtube.com/watch?v=KPzLgQv6EjY
TERRY PRATCHETT: http://www.terrypratchettbooks.com/

Um comentário:

  1. viva a crônica.
    faça mais crônicas - me disseram uma vez pra fazer, nunca soube. Ainda não me arrisquei.

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