quinta-feira, 11 de outubro de 2012

TRILOGIA TRICOLOR- PARTE I

PRIMEIRO CAPÍTULO: VERDE (por que não está maduro)

24 de dezembro de 1999.

Rogério e Carlos eram seus nomes, ainda que, na época em que essa história começa, fossem mais conhecidos como Roger e Carlinhos.  Ambos contavam por aí uns 20 anos.Tinham se visto muito no ano anterior, ambos com estrela vermelha no peito, panfletando em Ipanema por um candidato que nem chegara ao segundo turno. Agora, ambos tinham comparecido à mesma e insólita ceia na véspera de natal na casa de uma amiga em comum, aliás chamada Ana. A ceia era insólita por comemorar, além do natal em si, o falecimento do ex-presidente João Baptista Figueiredo, ocorrido naquele dia. Coisas da época, não se deve julgar nem generalizar.

Roger chegou mais cedo e ficou conversando com Ana, a anfitriã, tentando impressioná-la com alguns autores franceses que estava lendo na época, até que uma amiga dela, que se chamava Teresa Assis, se intrometeu e perguntou:

-Não tive paciência de ler esse aí até o final, então você podia me contar quem ganha?

-Quem ganha?

-É,  quem ganha. O Ser ou o Nada?

Antes que a latinha de cerveja esquentasse na sua mão, Roger estava perdidamente apaixonado.

Pouco depois, um tumulto na porta. Um grupo de bêbados tentava entrar na festa, falando alto. A maior parte das pessoas de dentro da festa, igualmente bêbada e falando tão alto quanto, não se opôs, mas um ou dois mais sectários entre os festejantes queriam barrar a entrada dos novos participantes por causa de suas roupas:

-Roupa de futebol não dá, tudo tem limite!

Indiferente a isso entrou na festa Carlinhos, que a despeito do nome no diminutivo era alto, e parecia mais alto ainda por trajar uma surrada camisa cujas listras verdes e vermelhas caíam na vertical, entremeadas por listras brancas mais finas. Roger, quando o viu, mesmo sem nunca ter falado com ele levantou-se e o abraçou.

-Porra!
-Fluzão!

Teresa Assis, que era flamenguista, só foi entender esse abraço quando viu, no dia seguinte, que somente dois dias antes o Fluminense começara a se reerguer da década mais negra de sua história, sagrando-se campeão  da terceira divisão do campeonato brasileiro. Quando Carlinhos descobriu que Roger chamava-se Roger aí é que as intenções românticas de Teresa pareciam fadadas ao fracasso, naquela noite. Roger, o herói da conquista tricolor, em nada além do nome se parecia com o magrelo barbudo que agora discutia avidamente os lances do jogo com seu novo amigo, mas era tarde demais. A ligação estava feita, os laços dos amigos unidos pelo tricolor. Lembrando-se do seu pai, que obrigava a casa inteira a ficar em silêncio quando o Flamengo entrava em campo, ela só pôde se resignar com o típicamente feminino "coisas do futebol".

Conforme a cerveja foi sendo bebida, não demorou para que a conversa dos dois amigos misturou a política com o futebol e, lá pelas quatro da manhã, Carlinhos e fez um dos seus típicos discursos:

-Pra Jesus nascer o Figueiredo teve que morrer. E é assim mesmo, o Romário teve que sair do Flamengo pra renascer o meu tricolor!  O único Figueiredo que presta é o de Magalhães, por que lá tem o único bar que passou todos... Todos os jogos do Fluminense desse ano!  Viva o Roger! O Roger tá aqui do meu lado! Fala aí, Roger... O Roger é foda, por que ele fez os gols da vitória, distribuiu santinho do Lula, leu sartre, mudou o brasil e continua de pau duro! Porra!!! Palmas pro Roger!

O mesmo sectário que tinha tentado impedir a entrada de Carlinhos na festa esboçou um contra-discurso dizendo que futebol era o ópio do povo, e dessa vez foi Roger que se levantou contra ele. Roger falou com a voz baixa que lhe era habitual, e como era habitual também todos ouviram o que ele disse, que mais tarde ficou conhecido como a primeira de suas profecias:

-É impossivel separar o futebol do Brasil. Os dramas do campo são os dramas do brasileiro, por isso na política a gente usa bandeiras. O PT... - e aqui ele parou e olhou todos os presentes nos olhos- O PT ainda está verde. Com o pensamento que vocês tem, tinha mesmo que ter perdido a eleição. Tem que jogar como um time se quiser chegar no poder. O PT tem que ser um time de guerreiros.

Teresa Assis imediatamente se pendurou no seu pescoço, dando-lhe um beijo molhado, e o resto da noite se perdeu entre cigarros, cerveja, sexo, verde, vermelho e branco.

CONTINUA...

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