sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

PRETO- noite ipanemense

Um por do sol turbulento
Povoado de meios-tons
Nenhum deles vazio ou isento
De certas fáceis emoções.

Na praia uma turba lenta
Esvazia camarotes e frisas.
É que seu olho não aguenta
O preto fundo e sem divisas

Que se advinha agora
No sono dos rubros-roxos.
Fim dos aplausos, é hora
Do adeus dos olhares coxos.

Só poucos permanecem
Diante do preto pré-preto
Do céu que se anoitece.
Um tom sem canduras, direto.

Só os olhares mais sãos
Que desprezam emoções fáceis
Encaram, serenos, os vãos
Do preto sem risos e faces.

Um preto que não veludo,
Um preto que a tudo isola,
Um preto que é preto tudo:
Um preto de coca-cola.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

BRANCO - poema de dois.

Uma tela clara, tão clara,
Que a todas as cores desbota.
Que os meios-tons separa
E só os brancos ampara.

Uma tela branca, tão branca,
Que, ao contrário de realçá-las,
De todas as cores arranca
O dom de ser cor não branca.

Essa tela e nós dois
Num sereno lugar sem nome
Que se tivesse seria "depois".
Olhando a paisagem de arroz.

E é a essa alvura completa
Que nós chamaremos "passado"
Nada passou, a vida é uma reta
Sem drama, sem dores, sem meta.

E saudaremos o haver sumido:
Paroxismo do desbotado,
Vivemos sem ter vivido,
Cada qual absolvido.

Cada qual higienizado
De tudo que é tom de terra.
O encontro cauterizado,
O olhar oxigenado.

E então concordadermos:
"Nada houve", "Nada ficou",
E no branco que escrevemos,
O não escrito é que leremos:

Uma tela branca, tão branca
Que ceifa sem dor cada dor
E, sendo absolutamente franca,
Todas as palavras estanca.

Nós dois em silêncio.

domingo, 24 de janeiro de 2010

DA PRAÇA

Como após um banquete fica a taça,
Ela está sem mais nada, só vazia.
Só cimento ardendo no meio dia,
Ela, a quem demos o nome de praça.

Estranha de sí mesma quando ria
Ainda ontem na noite obesa e baça,
Quando em meio aos homens e a fumaça
Se esquecia que o dia a silencia.

A praça agora é coisa de concreto,
Não é praça, é o mais puro chão reto,
Desafiando o sol quente do verão.

Canta a sí pelo silêncio do coreto,
E destrói meus lirismos de soneto
Que evaporam quando caem no seu chão.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Solilóquio de uma moça mal-amada

Queria um dedo médio
Que me masturbasse
Girando.

Como um polegar
Que navegasse
Um I-Pod Nano.