domingo, 8 de agosto de 2010

Misture bem e deixe a massa crescer














Escrevo sob e sobre a FLIP 2010, daonde acabo de voltar. "Sobre" por que esse é o assunto do meu texto, e "sob" por que ainda estou SOB o impacto dessa grande FESTA (pois, ao contrário do que pode se pensar, o f de flip não é de feira) que anualmente celebra a literatura e a cidade de paraty, duas coisas velhas que resistiram aos avanços do tempo conservando a sua beleza e o seu poder.

O homenageado da vez foi o sociologo Gilberto Freyre, numa atitude que surpreendeu a agradou, visto que mostrou que a literatura brasileira é plural e disversificada, não possuindo baluartes apenas no campo da poesia e da ficção (genêros aos quais pertenciam os homenageados até então). Claro que quando eu digo "surpreendeu e agradou" só posso estar dizendo por mim, sem generalizar minha opinião, pois é fato que na verdade a escolha foi controvertida. A moda de "proteção de minorias" que atacou o pensamento sociológico brasileiro fez com que determinadas escolas (represenatadas na FLIP) vissem em trechos isolados e fora de contexto de Freyre afirmações de cunho anti-semita, racista, etc, etc, sem levar em conta que o todo da obra dele atua justamente como DES-recalcador do nosso racismo, pro bem ou pro mal trazendo a questão do negro e do índio para o centro do debate sobre a identidade nacional. Claro que, para determinados cientistas que se dizem cientistas humanos mas são absurdamente cientifcistas, cerebrais e positivistas, é muito fácil atacar um autor que escreve tão a partir de seus AFETOS como Gilberto Freyre. Mas tudo bem. A FLIP mostrou quem estava certo no decorrer dos quatro dias.
Quatro dias de osteniva libertinagem literária, com alta licensiosidade libidinosa entre as escolas, as sintaxes, os conceitos e as palavras. As mesas onde Peter Burke e Robert Darnton discutiram o futuro do livro fornicaram conceitualmente com os poetas de rua da periferia de são paulo que conseguiram imprimir suas obras em tiragens simples e baratas graças à mobilização comunitária e divulgar seu trabalho na FLIP. O futuro do livro, em algum lugar entre o I-Pad e e o cordel de rua, nascerá com certeza desse equilíbrio entre opostos, dessa DEMOCRACIA RACIAL DE ENCADERNAÇÕES. Ao mesmo tempo em que isso acontecia, o chato do Richard Dawkins, aquele darwinista MALA que falou na FLIP passada, foi devidamente contraposto pelo pensamento mestiço do ingles arianíssimo Terry Eagleton, teórico da literatura, que lembrou a todos nós que não só Deus sobreviveu aos atentados terroristas de Nitty como também está mais revolucionário e marxista do que nunca. Linha de pensamento jamais "clara", jamais "limpa", jamais "objetiva", mas inebriada pelo ópio do povo, que não alieniza mas dá um barato muito louco. Terry Eagleton conversou com Gilberto Freyre talvez sem saber, mas isso é comum de qualquer FESTA. Mas o grande elogio à MESTIÇAGEM, à MISTURA, às IMPUREZAS, aconteceu mesmo na figura do nosso poeta Ferreira Gullar, que contou como se foi ao mesmo tempo o pai e o assassino do concretismo asséptico dos paulistas e depois o poeta que gerou o POEMA SUJO, obra de nome tão sugestivo quanto Freyreano. Quando o poeta, já tendo revisitado toda sua vida na mesa com a graça de um Clown (coisa que ele se tornou), começou a recitar um longo trecho desse poema-obra-prima, a FLIP inteira se encheu de lágrimas. Ou foram só os meus olhos?
Muito ainda pra dizer, até agora eu não mencionei o originalíssimo show de abertura (essa dobradinha nestrovski/lobo) e nem os poderosíssimos saraus que rolaram pelas madrugadas, mas acontece que estou cansado da viagem, e eufórico demais pra escrever decentemente. Basta resumir dizendo que em tudo puderam ser vistos os signos da mestiçagem, do sincronismo e do entrecruzamento (por que não dizer logo fornicação?) de idéias. Tudo sobre o signo de Freyre, semrpe muito maior do que os que tentaram fazer dessa flip o seu mausoléu.
E olha que eu nem comecei a falar ainda da cachaça...


LISTA DE COMPRAS- FLIP 2010:

O MISTÉRIO DO SAMBA- Hermano Vianna
CACHALOTE- Daniel Galera & Rafael Coutinho
ALGUMA POESIA, Fac Símile da 1a edição - Carlos Drummond de Andrade (Org. Eucanaã Ferraz)
O PRESIDENTE NEGRO- Monteiro Lobato
O DIA EM QUE JAMES BROWN SALVOU A PÁTRIA - James Sullivan
VOO DE PRIMEIRA CLASSE- Mannu U.F. & J.R. MC
LIVRETO SEM NOME DO POETA MAURÍCIO MARQUES

Para o futuro, prevejo a compra de livros dos senhores Robert Darnton, Salman Rushdie e Terry Eagleton.

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